terça-feira, 13 de setembro de 2016

O convívio e a privacidade

No fim de semana levamos um amigo pra conhecer a oca que foi construída na Fazenda Serrinha. Lá dentro ele perguntou se numa aldeia viviam várias famílias dentro da mesma oca e eu respondi que sim, aí ele disse: "nossa, privacidade zero, né?" e eu falei, meio que brincando, a primeira coisa que me veio à mente: "pois é... mas quando precisa de privacidade, vai pra mata!". Então começamos a conversar sobre isso e olha só que coisa: numa aldeia as pessoas convivem juntas, mas quando querem ter seus momentos de introspecção, de solidão, podem ir pra mata, pro rio. Nem sei se é assim mesmo, tenho um conhecimento raso da vida indígena, estou só supondo, mas pensar nesse mecanismo me fez ver que na nossa cultura fazemos exatamente o oposto. Vivemos cada família em sua casa, muitas vezes cada pessoa sozinha em sua casa, e quando queremos nos encontrar, vamos pra lugares de encontro, ou chamamos as pessoas pra vir em casa (coisa que tenho sentido cada vez mais rara na nossa dinâmica social...).

Viver dessa forma enaltece a privacidade e dificulta profundamente o convívio, porque pra conviver precisamos ficar agendando, pior, combinando agendas, dá um trabalhão! A única época da minha vida onde eu tive um convívio muito legal foi na faculdade. O campus era a casa de toda a turma. A gente se encontrava na rua, na lanchonete, no restaurante, no xerox, na biblioteca, no CPD. Ah, claro, nas aulas, rs... e desses encontros aconteciam desde meros "ois" ou sorrisos silenciosos, até grandes bate papos, onde nasciam ideias, projetos, festas. O convívio era fluido, era natural. Ah como era bom...

Então a gente se forma, vai morar sozinho ou em casal (ah, sim, na faculdade a gente geralmente morava em bando); arruma um emprego e esse passa a ser o nosso núcleo de convívio. Mas ali as regras são outras, você nunca sabe direito o que pode e o que não pode falar, o que pode e o que não pode acreditar... sem contar que a quantidade de pessoas com as quais você convive cai absurdamente. E os amigos de antes?! Estão espalhados pelo mundo... foram fazer mestrado na Amazônia ou nos Estados Unidos ou até mesmo na Tailândia. Ou então moram a duas horas de distância, mas nunca dá pra encontrar, porque só "sobram" os finais de semana, e fim de semana a gente visita família ou então tá meio sem grana pra botar gasolina e pagar pedágio, ou então tá cansadão da rotina puxada da semana e não quer saber de sair de casa - nem de receber visita.

Eu não sei qual seria a "solução" pra essa organização social que a gente criou, só sei que ela nos afasta. E esse afastamento tanto nos incomoda que começamos a criar meios de nos unir através da modernidade, via internet. Só que o virtual não substitui o real. O virtual pode ajudar os encontros a acontecerem, mas não é um encontro em si. O virtual só faz sentido se for meio e não fim.

Ultimamente tenho prestado bastante atenção pra sair de casa. Eu adoro ficar em casa e soma-se ao fato uma certa preguiça, uma certa inércia. Percebendo isso tenho aceitado quase todo convite que recebo e os desfechos são invariavelmente ricos, férteis. Aquela coisa do "tudo vale a pena se a alma não é pequena".

Mas isso ainda numa realidade de "fim de semana", na maioria das vezes. Porque durante a semana as pessoas estão em seus trabalhos ou em suas escolas... e eu, nobre vagabunda, vou buscando as brechas, como aquela plantinha que nasce na rachadura da calçada.


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