terça-feira, 8 de maio de 2012

Virada Cultural 2012


Reconheço que tenho um montão de assuntos muito mais relevantes e interessantes para escrever, mas é que eu gosto tanto desse evento e foi tão legal reler o relato da Virada 2010 que preciso deixar essa recordação para mim mesma aqui no Aralume!

Bom, a graça da Virada, pra mim, é virar! É passar a madrugada de show em show, é ver o dia clarear, é ver as ruas da cidade ocupadas, é respirar o ar de euforia coletiva! Mas como não sou mais adolescente e prezo por minha integridade física e moral, são necessários alguns cuidados... nossa turminha já está ficando expert em Virada e a mochilinha do Moli é prova disso. Casaco, mantinha, camiseta extra, desodorante, pasta e escova de dentes, lanchinhos, um verdadeiro kit de sobrevivência.

No meu kit Virada tinha agasalho de sobra, camiseta para o domingão ensolarado, necessaire com desodorante, colírio (e óculos escuros!), lápis do olho, pasta e escova de dentes e ainda um spray de própolis para cuidar da garganta castigada pelos gritos eufóricos e frio da madrugada. Coisa de profissional mesmo, hehe.

Gosto de começar o evento pelo centrão. Praça da República, São João e cia., ainda limpas e “possíveis”. Depois a dica é percorrer o circuito SESC, com atividades civilizadas e ambientes impecáveis. Vida de tiozão =D

O plano começou bem e depois de sentir o ar da noite com um jazz na República fomos para o SESC Vila Mariana, onde vimos Os Mulheres Negras, com a participação especialíssima de um músico uruguaio que é o “homem banda”, só vendo. Comemos por lá mesmo e entramos no show do Wandi Doratiotto, sempre simpático, engraçado e com um repertório muito gostoso. Na saída conversamos com ele, que tem uma receptividade incrível, falando com a gente como se fôssemos grandes amigos, muito legal mesmo. Por lá ainda tinha uma exposição de fotos de um cara que deu a volta ao mundo de bicicleta. Fotos lindas, instalação linda. Viva o SESC!



Já era 1h e fomos pro SESC Consolação, onde estava tendo uma programação especial sobre o México. Comemos umas iguarias mexicanas (embora já tivesse acabado quase tudo) e resolvemos voltar pro centro pra ver o Zimbo Trio na República. A lua (super lua, diga-se de passagem) estava esplendorosa e depois de ver dois shows em auditório foi uma delícia respirar o ar fresco da noite assistindo um show na praça. Só que o som estava meio devagar e pra espantar o sono (nisso já era umas 3h) fomos percorrer os outros palcos.

Acabamos parando no Anhangabaú para assistir o Quinteto da Paraíba. Cadeirinhas, primeira fila, tudo muito bom, tudo muito bem... só que montaram o palco debaixo do Viaduto do Chá e é claro que tinha uns espírito de porco lá em cima. Ficamos meio tensos com nossas cabeças sendo alvo fácil para uma cusparada (no mínimo) e depois que o companheiro da fila de trás vomitou ali mesmo, levantamos e fomos embora. Pois é, Virada é assim... só não pode perder a esportiva!

Caminhar pelo centro às 5h da madruga é uma experiência tensa. Aquelas pessoas parecem umas almas penadas, virando garrafas e garrafas (de plástico) de vinho ruim goela abaixo. Como diz o Moli, dá dor de cabeça só de olhar! Muito lixo pelas calçadas e um cheiro de mijo que beira o insuportável. Contando assim você pode até pensar que eu sofri, ou que caí numa roubada e não vou nunca mais, mas foi de boa! Na verdade, eu sabia exatamente o que ia encontrar por lá e estar psicologicamente preparada faz toda a diferença.

Não presenciamos nenhuma cena de violência e em nenhum momento passei medo. Se sorte ou ingenuidade, não sei, só sei que foi assim. Comemos um milho cozido delicioso, paramos mais um pouco no palco República pra ouvir a banda argentina Violentango, nos despedimos daquela lua absolutamente majestosa e fomos pro Largo do Arouche, onde estava minha grande expectativa da Virada: Bloco do Sargento Pimenta às 6h!

Chegamos lá às 5h50 e aí sim vimos o que era uma cena de filme de terror! Uma gente feia (desculpa Rafa!), uma atmosfera de Blade Runner naquela penumbra pré amanhecer, coisa de filme mesmo. E pra completar, os gays mais esdrúxulos e menos recatados tomavam conta do cenário. Fomos salvos pelo PC, que conhecia uma padaria muito boa por ali, a Gemel. Nossa, um verdadeiro oásis! Ambiente claro, limpo, cardápio farto, pia com sabonete, garçons atenciosos. O público continuava gay, mas agora de outra estirpe. Gays charmosos e elegantes tomando seus capuccinos!

Quando saímos na rua já estava claro e eu queria muito dar uma chegadinha no Bloco. Atravessamos o Largo, que acabara de ser exorcizado pela luz do sol! Impressionante como em menos de uma hora o público (e a atmosfera) tinha mudado. Era 6h30 e o Bloco estava subindo no palco. Não foi nada que se diga “ó”, mas deu pra dançar e espantar o sono.

Fomos resgatar a Dalva, que ficou descansando na Maria Antonia, e ainda usufruímos dos banheiros limpos da USP antes de seguir para o nosso próximo compromisso: Jair Rodrigues no SESC Pompéia às 9h. Deu tempo de tomar um expresso e descansar um pouco nos sofás do SESC antes do show e lá fomos nós.

À essa altura o sono já estava bem instalado e estávamos meio que preparados para tirar um cochilo no show. Até parece... o Jair entrou como um furacão, mandando um samba atrás do outro, só clássicos. Uma energia que chegava a ser intimidadora! Uma sintonia e uma simpatia com os músicos e a platéia que eu nunca tinha visto. E foi muito engraçado ver o assédio das velhinhas, que ficaram alucinadas!

Depois do bombardeio de sambões, um mais animado que o outro, ele deu um respiro, falou de sua devoção pela padroeira do Brasil e cantou Romaria. De arrepiar mesmo as peles menos religiosas. Logo em seguida chamou a Elis pro palco. Conversou com ela. Contou sobre o Dois na Bossa. E prestou sua homenagem à companheira, nesse trigésimo ano de sua morte. Ele simplesmente cantou Arrastão. Nem tentei conter as lágrimas, que nem sabia exatamente porque surgiam, mas foi um episódio muito forte. Acho que mesmo quem nunca ouviu falar de Elis Regina e Jair Rodrigues se emocionaria com a emoção do cantor no palco. Depois dessa ele saiu de cena, deixando um dos músicos tocando viola. Jair volta cantando Disparada, haja coração!

“porque gado a gente marca, tange, ferra, engorda e mata, mas com gente é diferente!”

Saímos do show a mil. Se tivéssemos dormido uma noite inteira não estaríamos tão bem dispostos. É claro! Fomos resgatar a Ana e o Leo, que preferiram dormir meia noite, e seguimos para o encerramento da (nossa) festa: Titãs ressuscitando Cabeça Dinossauro, 12h no Palco São João.

Chegando na São João por uma perpendicular víamos de longe o rio de gente se dirigindo para o palco. Comi um pastel de palmito e fomos nos emaranhando naquele amontoado. O espaço entre cada um foi diminuindo e só a passagem de som já empolgava a galera. A pérola do evento ficou por conta de um rapaz que nos fez a seguinte pergunta: “viu, são duas bandas? A Cabeça Dinossauro e os Titãs?”. Ô dó! Rimos com discrição e explicamos pacientemente pra ele do que se tratava. Nessa hora me senti uma dinossaura!

E então eles entram no palco! Haja garganta e palmas! Começa a piração e lá pela terceira ou quarta música o Moli fala: “se prepara que na Polícia vai ficar tenso”. Dito e feito! Todos queriam expressar sua indignação contra a entidade policial e tinham ali a melhor das oportunidades. Do nosso lado começou aquele agito característico dos shows de rock, onde fica todo mundo se batendo, mas num clima muito amigável e fraternal, uma verdadeira massagem coletiva. Era lúdico, não era violento. Mas não tinha como não pensar que se alguém tropeçasse no meio daquela muvuca poderia ser seu último tropeço... pensamento de tiazona... cuidado minino!

E por aí foi. Muito, muito, muito bom! Foi interessante mergulhar no lado raivoso da arte.

“você vai morrer e não vai pro céu, é bom aprender, a vida é cruel!”

Já tínhamos desistido de ficar até o fim da Virada, mas depois dessa a única opção possível realmente era ir pra casa. E foi engraçado chegar na casa da sogra com aquelas olheiras, com aquela “inhaca” de quem passou a madrugada perambulando pelo centro, com aquele “budum” de quem acabava de sair de um show de rock em pleno sol do meio dia. Olhei pra mim e pensei: “minha filha, você tem 31 anos, é uma engenheira, é uma mulher casada, olha só o seu estado!”. A adolescente dentro de mim, aquela que sempre vive e que sempre viverá, aquela lembrada sabiamente pelo Seu Jorge na “minha” música Carolina, simplesmente abriu um sorriso de satisfação, o suficiente para dizer: “Estou VIVA”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário