terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Eu comigo nos Andes - voltando pra casa


A volta pra casa foi longa... devido a "facilidades tarifárias" (ou em português claro: porque era mais barato!), o caminho de volta contou com uma noite em La Paz, porque não tem voos da Aerosur de Cusco para São Paulo todos os dias, enfim, foi o jeito que demos para viabilizar a viagem... enquanto fazia a peripécia pensei se tinha mesmo valido a pena, em termos financeiros, porque essa noite em La Paz envolve comer ($), ter um lugar pra dormir ($$), táxis de ida e volta do aeroporto pra cidade ($$$) e a maledeta taxa de embarque que se paga no aeroporto de La Paz (US$ 25,00 - $$$$$$$$).

Mas como o que tá feito, tá feito, não me lamento, só deixo aqui registrado para quem queira se aventurar pelo roteiro. E, no mais, essa volta foi pra fechar com chave de ouro todas as expectativas e anseios que eu tinha com relação a essa viagem. Se poderia ser difícil e desafiador, pra que simplificar?!?!

A "espera" pela volta começou ainda no meu quartinho em Cusco. Sexta-feira de manhã tive a última aula, a tarde saí para comprar mais umas coisinhas, mas o tempo estava chuvoso e não dava nem pra usufruir do simples prazer de caminhar a toa pela rua... sabadão foi um tédio, com tempo também chuvoso, mas ainda dei uma saída pra almoçar, ver umas feirinhas de artesanato e só... a partir do sábado a tarde eu já estava "ligada" no fuso do Brasil, mas na realidade tinha três horas a mais, ou seja, imagina o téééééédio!!!

No domingo acordei cedo, terminei de arrumar as coisas e, até que enfim, aeroporto! Só que chegar no aeroporto, por mais que dê a sensação de estar indo pra casa, não é chegar em casa... e lá se vai mais um tempo em filas e procedimentos burocráticos de voos internacionais... chegando em La Paz, temperatura de 11 graus, com direito a chuvinha...

Eu, que queria dar mais uma passeada por mercados e feiras de artesanato, me contentei com um almoço no Sol y Luna e fiquei quietinha no albergue! Fiquei no Hostal República, onde a noite em quarto compartilhado me custou 50 bolivianos (ou algo como 15 reais). Quando cheguei não tinha ninguém no quarto, ele era todo só pra mim! Fiquei um tempo me sentindo a princesa do castelo, até que chega um cara.

Um italiano muito simpático (ah, nem precisa gastar sua imaginação com estereótipos de italiano!!! O rapaz era bem afeiçoado sim, mas longe do que costumamos imaginar por aí...). Conversamos bastante, ele é um pouco mais velho, não tem aquela pinta de moleque-viajando-sozinho, dos quais eu passava longe! E o mais interessante é que ele só viaja com bagagem de mão! Um mês viajando por outro continente com uma mochilinha de 30 a 40 litros, no máximo. Fiquei morrendo de inveja e me sentindo uma dinossaura gorda com meu mochilão MAIS bagagem de mão... desafio para a próxima viagem ;)

Tomei um banho, jantei e fiquei lendo na cama, me sentindo numa sala mega VIP, porque aquela estada em La Paz acabou sendo exatamente isso: sala de espera. Até que um pouco mais tarde entra no quarto outro moço, perguntando se as camas estavam vagas (ah, sim, o bom desse hostel é que não tem beliche! O quarto é grande e tem cinco camas). Eu já tinha me esparramado pelo quarto, mas tratei de recolher meus "trem", porque ele disse que estava com mais dois amigos.

A indefectível pergunta "de dónde eres" e ele me disse que era californiano (mais uma vez, não precisa imaginar um surfistão sarado de desarrumadas madeixas loiras... era um rapaz "normal", rs...) e que estava com dois indianos, que moram há 10 anos nos Estados Unidos. Os indianos entraram em seguida e, por sorte, também não eram nada estereotipados, hehe...

Depois fiquei pensando nesses estereótipos que a gente cria e imaginei os rapazes com os quais dividi o quarto naquela noite contando que tinham dormido com uma brasileira... se eles não condiziam com os estereótipos de italiano, californiano e indiano, eu muito menos com o de "brasileira"... então tá tudo certo, rs...

Enquanto estava lá no quarto, os moços entrando e saindo, conversando, arrumando as malas, pensei que coisa louca essa de dormir no mesmo quarto que pessoas TOTALMENTE estranhas! Dormir é uma coisa muito íntima, a gente ronca, baba, fica vulnerável... não cheguei a ter medo, nem a ficar incomodada, mesmo porque eles foram super educados e discretos, mas também não consegui ter aquele sono profundo e reparador... coisa de sala de espera!

A alvorada na segunda foi às 5 da matina, saí de fininho do quarto e mais um táxi pro aeroporto. Chegando em El Alto, o bairro alto de La Paz onde fica o aeroporto, uma coisa esbranquiçada nos jardins chamou minha atenção. Pensei "o que esses bolivianos inventaram agora, que tiraram os enfeites esdrúxulos do Natal?"... e todos os jardins estavam com "aquilo"... chegando no aeroporto, constatei ao olhar de perto que era... NEVE!!! Olhei em volta e vi os carros cobertos de gelo, uns pinheirinhos esbranquiçados, a grama coberta, tudo branco... adorei, imagina se não?! Afinal, como ouvi uns bolivianos dizerem por lá: "brasileiro adora neve!"

Fiquei doida pra tirar foto, mas primeiro o dever. Fiz o check-in, troquei dinheiro (umas moedinhas de Soles mais R$ 2,00), pois precisava pagar a tal taxa de embarque. Pelo menos aceitaram a nota de 20 dólares que estava com um rasguinho e não aceitaram em Cusco... aí então fui tirar umas fotos. O gelo já estava derretendo, mas mesmo assim me diverti! Os cumes nevados estavam ainda mais perto, parecia que era só eu atravessar a rua pra afundar o pé na neve!

Fui então para a sala de embarque, que estava melancolicamente quieta... um silêncio de despedida. Para encompridar a história, tem uma conexão em Santa Cruz de la Sierra. Nesses três voos em dois dias, tive tempo pra pensar em algumas coisas ligas à temática... por exemplo: a Aerosur é uma empresa boliviana (que "se orgulha de ser boliviana", conforme suas propagandas), mas as aeromoças são todas braaaaaaancas. É intrigante, porque quando você anda pelas ruas da Bolívia, vê aquela população super característica, com traços indígenas fortíssimos, ou vê turista! Eu ficava intrigada pensando onde tinham ido parar os espanhóis... mas entre os voos me dei conta de que os descendentes dos colonizadores viraram comissários de bordo =D

E, preconceitos à parte, los chicos más churros que he visto son los comisários! Pelo menos eles estão limpinhos, com barba feita, cabelo alinhado, roupa também limpinha... Em conversas com amigas, costumamos dizer que quando estamos em um lugar onde as pessoas não são assim, super bonitas, com o tempo "a vista acostuma" e você já começa a pinçar um cá e outro lá... não sei se é porque to ficando velha mesmo, mas a vista não acostumou! Não que eu estivesse buscando, mas gosto de ver pessoas bonitas... e com toda aquela diversidade étnica achei que fosse me deparar com tipos interessantes... que nada! De forma geral a galera é bem bizara... (meninos E meninas...).

Um outro item do tema "vida aérea" é que dessa vez a cortininha da primeira classe se me mostrou uma coisa um tando quanto incômoda... tipo: "eu separo você das pessoas privilegiadas". Fui provocando minhas reflexões e lembrando que eu não acho que todos tenhamos que viver sob um regime estritamente igualitário. Igualdade de opções é uma coisa e igualdade de escolhas é outra... vou tentar explicar melhor: se todas as pessoas tivessem condições econômicas iguais, certamente não seria um mundo onde "todo mundo pode fazer tudo", afinal, as riquezas são finitas. Então, uns optariam por viajar de primeira classe, outros optariam por dormir em um hotel mais confortável, outros ainda prefeririam comer um verdadeiro banquete, outros iriam comprar presentes pra toda a família... todos cientes de que, se não estão em condições melhores agora, foi porque optaram por essas condições em outra situação OU se tem pessoas em condições piores do que a minha agora, em outras situações elas estarão melhores... nesse mundo ideal então, haveria cortininha separando a primeira classe?! Não sei, hora de trocar de avião!

O último e mais longo voo teve turbulências e conversas com o colega de poltrona, brasileiro é claro, e aí falei pelos cotovelos, tudo que eu não tinha falado esses dias, seja por falta de familiaridade com o idioma, seja por falta de interlocutor... No mais, tudo tranquilo e pontual e, adiantando duas horas no relógio, cheguei em São Paulo no fim da tarde, como previsto.

No iPod o Eddie cantava " Pode me chamar que eu vooooooou! Eu vou, eu já tô aí!". Meu ano começa, oficialmente, agora. A agenda (que não tenho) está praticamente em branco, embora os planos e expectativas sejam muitos!

Chegando em casa, a alegria de ver o Pajé e o Jawa foi muito maior do que eu supunha! Transbordante, dos três lados! E tive também uma estranha sensação de que minha casa é enorme... nunca tinha percebido como meu banheiro é grande, como meu quarto é grande, como tenho tantos cômodos!... talvez também porque ela nunca tenha me parecido tão vazia... é irônico "começar o ano" sozinha... e, mais uma vez, a viagem me traz experiências inéditas e arrebatadoras pois, pisar em casa não foi exatamente o fim da peregrinação... ela tem ainda mais uns dias, de reorganização interna e readaptação ao fuso horário ;)

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